quarta-feira, 13 de julho de 2011

Enroscada pedra (a do tempo) que o sol declina


Voltou, hesitante, com as mãos sobre os olhos,
um fruto sem luz que em intemporais páginas
guardava a voragem desvanecida das horas.
Era um pássaro no umbigo ou um deus
que atravessava cego, os tempos mais verdes
mais brancos que o canto
que as minhas palavras não poderiam pronunciar.
Poderia imobilizar o teu ouro
no ventre que me susteve, sacudia
portanto a luz para o vazio dos ciprestes
e vigiaria um silêncio próprio,
entregue às mãos de um tempo maduro.
É em Agosto que se agasta a sede,
essa de ter fome de lábios que gelam o encanto,
pudesse eu, então, entoar a minha pátria
numa desconhecida terra
e desenterrar o sangue da solitária vida.
Mas estes braços, tão indefesos,
brilham com altíssimos girassóis,
percorrem as fissuras do vento
que por vezes pernoita no interior dos olhos
e isto para dizer que o coração mexe
por vezes sem sentido e que a morte é próxima,
que sorri por entre o sorriso da vida
e que o tempo e suas pedras flamejam
nas sílabas de sempre
e crescem
no longínquo exílio, meia hora antes das dez
com uma só narina
a apalpar um perfume ou um cigarro,
cigarra na garganta
e uma carícia a voar até ao escuro.

Entrarei com uma faca
a fingir que sou eu.
Chamar-me-ão com todas as feridas
para que o amor se preserve na carne
e defronte do pão de cada homem
uma pedra em forma de pão,
fermentada
com a memória a entregar
a sua rubra beleza aos cisnes e aos flamingos.
E tu, irmã ou esposa ou mãe,
palavra a arder nos dentes,
a reclinar a sombra, mármore que nasce
no espaço dos dias e que se move
em tão rara beleza
que jamais saberei decifrar.
Anota esta frescura que sobrevive,
é sangue esvaído de curtíssimos séculos,
exangue,
tão exangue quanto os pombos
de inverno
e através deste tempo contíguo,
apenas uma dor,
a que afrouxa a alma ao ladrar no sono
para que os visitantes saibam
que o sonho está guardado.
Estará a luz caída no chão
a evaporar os seus nomes para que não
a conheçam.
Esperar-te-ei num país sem relógios,
(como no filme silvestre de Ingmar Bergman)
para que chegues atrasada,
em derradeiro silêncio, ao fundo da voz.
Agora dá-me a tua mão,
agora mesmo, verás, o sol escurecerá.


luís de aguiar

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